COMO A AUTOCOMPAIXÃO PODE NOS SALVAR DO IDEAL DE PERFEIÇÃO

Por Marleide Rocha - Psicóloga

@clinicamarleiderocha

Você já notou que quando um amigo busca ajuda para lidar com alguma adversidade ou erro na maioria das vezes (se não todas as vezes) adotamos uma postura de acolhimento e gentileza? Porém, quando somos nós que falhamos adotamos uma postura crítica muito severa!

Qual é o seu diálogo interno quando você comete um erro ou falha em alguma situação de sua vida? Quão compreensiva e acolhedora você é em relação as suas imperfeições?

O mundo atual cobra perfeição em todas as áreas da vida de uma pessoa: se não for um profissional brilhante perderá e emprego; se não for o marido ou esposa ideal o relacionamento terminará em divórcio; se não estiver enquadrada no padrão de beleza precisa ser “harmonizada”; envelhecer então nem pensar.

Mas o ideal não existe e só serve para alimentar o ciclo: culpa, frustração e punição.

A autocompaixão entra em cena para interromper esse circuito fechado adoecedor. É uma prática na qual aprendemos a ser um bom amigo de nós mesmos quando precisamos.

Isso não significa resignação ou passividade frente aos momentos de adversidade, mas sim nos ajuda a aprender com os erros que causaram nosso desconforto em primeiro lugar.

Pesquisas sobre o tema apontam que a autocrítica negativa e severa tende a aumentar nossos níveis de infelicidade e estresse, aumenta a procrastinação e diminui a nossa capacidade de atingir nossos objetivos no futuro.

Em contrapartida, os estudos sobre a autocompaixão apontam que aprender a nos acolher de maneira amorosa pode aumentar a nossa resiliência emocional, melhorar a saúde física e mental e contribuir para o bem estar e a melhoria da produtividade.

A definição da autocompaixão envolve três aspectos essenciais que precisam estar ativados quando sofremos:

• Autobondade: nos tratar como geralmente tratamos os outros, com cordialidade e generosidade ao invés de recriminação. Tolerância às nossas falhas pessoais. Apoio e encorajamento frente as adversidades;

• Humanidade Compartilhada: reconhecimento de que todo ser humano (isso nos inclui) experimenta dificuldades e falhas, o sofrimento é algo inevitável da experiência humana. Embora pareça uma afirmação óbvia, a nossa tendência é o esquecimento dessa verdade quando sofremos e nos sentimos isolados, inadequados e solitários em nossa própria dor e geralmente nos tratamos com hostilidade.

• Mindfulness: experimentar o momento presente, mesmo que ele seja desagradável, sem ser absorvido pelos pensamentos e sentimentos negativos. Postura de um observador curioso frente as experiências, sem julgamento, resistência ou fuga.

Assim autocompaixão pode ser definida como a presença amorosa conectada capaz de transformar a nossa relação com nós mesmos, com os outros e com o mundo.

Essa transformação nos liberta do ideal de perfeição, pois integramos à nossa consciência as nossas imperfeições e compreendemos que elas não são defeitos que nos desqualifica e sim parte nós. Que podem ser aperfeiçoadas, se este for um desejo genuíno nosso, e não para suprir uma demanda externa, como uma imposição social, por exemplo.

Autocompaixão e autoestima são a mesma coisa?

Não, talvez sejam “primas próximas”, mas não a mesma coisa. A autoestima se refere a quanto valorizamos a nós mesmos e se nos vemos sob uma perspectiva positiva, ela não é estável porque sempre seremos melhores ou piores em comparação aos outros, geralmente contribui para o excesso de competividade e aumenta sensação de insegurança ou inadequação quando nos julgamos piores do que alguém ao nosso redor.

Autoestima	Autocompaixão
Avaliação positiva do seu próprio valor	Relacionar-se com as situações da vida com gentileza e aceitação, sem julgamento
Sentir-se melhor do que os outros	Reconhecer que todos nós somos imperfeitos
Está conosco nos momentos de sucesso, mas nos abandona quando fracassamos	Está sempre presente em nós, é o nosso apoio quando o nosso mundo desaba
Envolve aspectos de atratividade física, desempenho e sucesso	Autovalorização, depende menos de comparações sociais e menos narcisismo

 

Exercícios para desenvolver mais autocompaixão no seu dia a dia

• Fisicamente – suavize o corpo

Como você se cuida fisicamente (por exemplo: alimentação, exercícios, banho quente, xícara de chá)?

Você consegue pensar em novas formas de liberar a tensão e o estresse que se desenvolvem no seu corpo?

• Mentalmente – reduza a agitação

Como você cuida da sua mente, principalmente quando está sob estresse (por exemplo: medita, assiste a filme leve, lê um livro inspirador)?

Há alguma nova estratégia que gostaria de experimentar para permitir aos seus pensamentos fluírem com mais facilidade?

• Emocionalmente – acalme-se e conforte-se

Como você se cuida emocionalmente (por exemplo: brinca com o seu pet, escreve em um diário, cozinha, toca um instrumento)?

Há algo novo que gostaria de experimentar?

• Relacionalmente – conecte-se com os outros

Como você se relaciona com o outro de alguma forma que lhe traga felicidade genuína (por exemplo: encontra-se com os amigos, envia uma mensagem de aniversário, pratica alguma atividade esportiva coletiva)?

Há alguma forma que gostaria de enriquecer essas conexões?

• Espiritualmente – comprometa-se com os seus valores

O que você faz para se cuidar espiritualmente (por exemplo: reza, entra em contato com a natureza, faz alguma atividade voluntária, lê algo sobre o tema)?

Há algo mais que gostaria de fazer para ajudar a alimentar a sua espiritualidade?